Claudia Raia roda o Brasil com superprodução

Posted segunda-feira, janeiro 25, 2010 by Fernanda Borge Gabriel
Por Carolina Marques



"Às vezes tenho vontade de pegar um táxi e ir pra Lua!”, diz Claudia Raia, durante o trajeto que faz entre os Armazéns 1 e 2 do Píer Mauá, na Zona Portuária. São quase seis da tarde e a atriz dará um workshop para estudantes de dança e teatro de ONGs cariocas. Ela passou o dia todo ensaiando passos, músicas, checando detalhes. O calor de lascar é minimizado pela assistente e braço direito e esquerdo Magali Elena, que pega uma camisa e abana Claudia enquanto ela fala sobre o musical “Pernas pro ar”, que estrearia dali a três horas na cidade, com ares de superhipermegaultraprodução.
— É de matar. Uma loucura mesmo. Olho para tudo isso (o cenário) e penso: ‘nunca acaba...’. Meus amigos dizem que deveriam me internar. Só uma insana como eu para empreender um espetáculo desses. E olha que muita gente fugiu da raia, literalmente. Tem que ter peito! — , dispara a atriz, que vai levar o espetáculo a pelo menos 30 cidades brasileiras: — Tudo isso nasceu quando sonhei que estava numa caixa e andava pelo país.
E haja pernas! Para dançar durante oito horas por dia, bem como para subir no salto e ir atrás de patrocínio.
— Todo mundo pensa que por ser Claudia Raia é mais fácil arrumar patrocinador. Mas não é. Tive que botar dinheiro do meu bolso também. Seria um espetáculo caro em qualquer parte do mundo — diz.





Cutucada na rotina
Com custos de aproximadamente R$ 800 mil, o musical abusa dos efeitos tecnológicos para contar a história de Helô, uma mulher aparentemente comum, com uma vidinha sem-graça e que, numa bela noite, vê suas pernas tomarem vida própria. Daí, Helô ganha o mundo. Mas sem nunca sair do próprio quarto, que divide com o marido, um daqueles homens que jamais reconhecem o valor da mulher que dorme ao lado:
— Queria falar desse universo feminino. Uma mulher comum ora é feliz ora não. Tem uma mesmice, uma não ousadia por medo de errar ou de perder aquilo que já se conquistou. A mulher é meio multifuncional, né? Quantas de nós não têm que ser boas donas de casa, lindas, magras, boas mãe, superprofissionais? É um universo em que o homem jamais entrará. E de repente, quando se para para pensar, os sonhos, os desejos ficaram para trás. Percebo muitas mulheres na plateia cutucando o marido em certas cenas, nas reflexões que fazem. E eles ficam com aquela cara, sabe, de ‘finjo que não entendo’. Além de ser um espetáculo de entretenimento, tem uma parte que mexe, que cutuca.


Alice, desce do lustre!
Nessa espécie de versão adulta e pós-moderna de “Alice no País das Maravilhas”, Claudia é acompanhada por quase 50 pessoas. Na linha de frente, tem no produtor e cunhado (ele é casado com a irmã, Olenka Raia) Fernando Pagan um anjo da guarda, que, vá lá, faz também às vezes de Grilo Falante.
— Claudia é exagerada, né? Não é só no tamanho (risos). Então, ela sonha e eu executo. Mas, claro, que tem a hora de trazê-la de volta ao chão — conta Fernando, que impressiona pela calma com que transita pelos bastidores ainda caóticos de um dia de estreia — Já nem me lembro mais o que é dormir.
Nem Claudia. Enquanto se maquia (ela própria coloca a mão na massa) num camarim exclusivo montado na parte de trás da tal enorme caixa/palco de Helô, decorado com fotos do marido Edson Celulari e dos filhos Enzo e Sofia nas paredes, ela discorre empolgada sobre a nova empreitada.
— Edson está fazendo “Hair Spray” e quando chega em casa diz: ‘agora entendo tudo’. Esse “tudo” são as horas em que tenho que passar longe da família, das exaustivas reuniões e ensaios, de todos os sacrifícios. Edson foi o primeiro a saber dessa produção. E me deu toda a força do mundo — explica a atriz.



Além do corpão
Magérima e com músculos que saltam à vista numa malha de cor laranja, Claudia é um desacato para qualquer mulher que, como ela, já passou dos 40. Em nada lembra as formas arredondadas que adquiriu no corpo de Donatela, o último papel na TV. Algo que acabou a aproximando bastante das mulheres comuns.
— Sabia que eu estava engordando. Trabalhando 18 horas por dia, ansiosa, comendo, sem tempo para fazer uma esteira sequer. E foi bacana para mim, sabe? Sempre fui vista como o mulherão, coxão, bundão. Foi uma forma de testar um outro jeito de estar. Meu trabalho rendeu mesmo eu estando acima do peso, mesmo eu não estando tão bonita. Tem uma atriz aqui e mora gente dentro desse corpo. Tenho 43 anos. Daqui a pouco não vou estar assim. A gente vai envelhecendo. Não tem jeito, existe a lei da gravidade.
A tal lei, aparentemente, não parece ter efeito sobre Claudia. Ao menos no palco. Ela se confunde — ou se funde — com o elenco formado, em sua maioria, por gente com quase 20 anos a menos. De um lado para o outro, seja dançando, fazendo alongamento, aquecendo a voz, dando algumas ordens, a “Whitney Houston do teatro”, como se refere a ela o amigo Miguel Falabella, parece incansável. Até mesmo quando defende o gênero musical, ainda visto por muitos como uma arte menor:
— Costumo dizer que é uma arte dos três cérebros: um para atuar, outro para dançar e ainda outro para cantar. Hoje, as maiores bilheterias do teatro no país vêm de musicais. É inegável. Uma parte dos intelectuais torce o nariz para o gênero. Faço parte de uma trupe que trouxe parte dessa cultura dos musicais para o país. Tenho o maior orgulho disso. Porque é muito fácil se frustrar fazendo um espetáculo desse tipo. São inúmeras adversidades. Mas ninguém derruba meu castelinho, não.



Pernas no lugar
Com as malas prontas para rodar o Brasil, Claudia só volta à televisão no segundo semestre, na novela “Ti ti ti”, nome provisório do remake escrito por Maria Adelaide Amaral. Até lá, caminha a passos largos com sua caixa de sonhos e os 12 figurinos, seis pares de sapatos e alguns adereços de Helô, em direção a um público que jamais assistiu a um musical:
— Já pensou o que é poder fazer isso? Andar por esse Brasilzão? — questiona entre incrédula e estupefata: — Minhas pernas sempre foram inquietas. Sempre tive uma perna lá e outra cá. Segundo minha mãe (Odete) parece que estou sempre com o pé na porta para ir a algum lugar. E estou mesmo. Queria ir atrás dos meus sonhos. E nisso ninguém me segura. Não porque eu seja forte ou incrível. É porque quero sempre mais. O único que me para é Deus, que quando vê minhas pernas tomarem vida própria, me desequilibrando, dá um jeito de me fazer parar. Aí já sei. É hora de manter as pernas no lugar.

Fonte: Canal Extra, Blog Maria Claudia Raia

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